Sobre ontem à noite

 

Eu gosto de ver você enfurecida, áspera, histérica nos mínimos detalhes.

Seu estresse me transporta para uma zona de conforto.

Sinto paz quando vejo uma fumaça saindo pelos seus poros, seus ouvidos, suas narinas.

Como me dá prazer sentir a sua fúria vibrando na minha pele!

Nesses momentos, esqueço até que tenho medo de você.

É mister para o meu bem-estar ver você descendo do salto, quebrando o protocolo, rasgando a constituição na frente do juiz.

Por isso lhe instigo e torturo com a minha letargia.

Sei muito bem a parte que você mais gosta em mim.

Sei muito bem que você se apraz com o meu lado taciturno.

Porém, não deixo o meu silêncio retumbar no seu talhe de mulher misteriosa. Enfim, prefiro fazer você perder a linha com as minhas cantadas baratas.

Através do meu tato descobri onde a sua carne é mais branca, seu ponto forte, seus músculos. Não mexo!

Meu flagrante de delito é burlar as coisas boas que falo de você quando sou pego de surpresa na esquina. Depois, disfarço, digo que estava sonolento.

Você vem direto, eu viro... o meu rosto.

Você me morde. Eu saio.

Não quero o gosto da sua saliva na minha língua.

Não quero a marca de seus caninos no meu pescoço.

E tampouco quero que o meu sangue adoce as suas entranhas de vampira no cio.

Confesso: sou inconstante mesmo.

De uma hora para outra, faço tudo diferente.

Mudo a cor.

Mudo o tom.

Mudo o humor.

Abro um sorriso num momento impróprio.

Se eu pedir mil beijos, não me contrarie.

Faça! Você está aqui para me obedecer.

Feliz, conto um a um.

Se ficar faltando apenas um que seja, suma da minha frente de uma vez por todas, pois não sei o que posso fazer com você.

Passando de relance encontrei onde mora a sua loucura. Não bato na porta! E tampouco aceito um convite para tomar um café dentro do seu estado alucinatório. Deixa do jeito que estar. Não quero o seu mundo etéreo. Enfim, eu me contento com o charme de sua lucidez.

Sei muito bem que não venço uma peleja contra você, mas insisto, no afã de lhe ver a ponto de me dar um tapa.

Porém, não quero!

Isso é muito para mim, pois alcançaria o êxtase ao ver todos os dias a marca de sua mão na minha cara na frente do espelho.

E até nisso eu lhe contrario, pois não quero que você saiba que estou feliz quando vejo um vestígio seu na minha tez.